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Meus devaneios como desenvolvedor: filosofando sobre as necessidades dos clientes

Estava elaborando minhas ideias “polêmicas” e resolvi colocá-las para debate e discordância da galera. Sobre a forma como os fornecedores de software (em especial os pequenos) são mestres na arte de somente abaixar a cabeça e dizer sim ao cliente, empurrando as consequências desastrosas organograma abaixo.

É insustentável para ambos os lados um cliente querer fazer de seu fornecedor de software externo o seu “setor de TI”. Cada pequena demanda ter que virar um pedido, muitas vezes para resolver problemas momentâneos. O que um consumidor de software deve buscar é independência e, claro, isso exigirá dele alguma boa vontade extra em aprendizado e esforço nas tarefas. Mas querer delegar cada detalhezinho para o fornecedor provocará uma sobrecarga que mais cedo ou mais tarde azedará a relação.

Isso ocorre quando o cliente se acostuma a (a ele é permitido) pedir as coisas de forma reativa: na pressa, cada pequeno problema é encarado como um pedido que pode ser feito no balcão do McDonald’s. “Resolve tal problema para mim.” É viável uma empresa de software (em especial uma pequena) atender todos os seus clientes dessa forma? O cliente que espera ser atendido assim, ainda mais pagando barato, não está iludindo a si mesmo, achando que vai obter comodidade ao invés de dor de cabeça?

Penso que as funcionalidades de um software devem ser demandadas de forma estratégica, não tática. Cada demanda é analisada pelo seu potencial de gerar valor futuro, e não resolver dores de momento. Se alguma dor é recorrente, é válido querer atacá-la. No mais, a independência de que falei antes é a forma que considero sustentável de resolver determinados problemas. Um sistema deve ter um meio de exportar sua massa de dados (ou parte dela) e uma empresa tem que ter gente que no mínimo saiba usar um Excel para analisá-la. Ou PowerBI, SQL, R/Python, qualquer coisa que permita à empresa ser independente da implementação indiscriminada de funcionalidades ou de ficar pedindo análises de dados ad hoc ao fornecedor do seu software.

Se você precisa de alguém para programar ou analisar dados constantemente, um “setor de TI”, é melhor ter o seu próprio – seu fornecedor tem outros clientes e, se ficar dizendo “sim” a tudo que você pede, é porque está mais preocupado em vender. Muita gente de alto escalão também parece que gosta de ser iludido/a, de massagens no ego, de sentir que o fornecedor vive para ele/a… Mas é preciso entender que software tem um custo (alto) para ser desenvolvido, então é preciso priorizar, planejar, demandar de forma estratégica e bolar formas sustentáveis de lidar com o tático.

Na minha opinião faz parte do papel do consultor não apenas executar o que o cliente quer mas também dizer não quando necessário. E aí entra a questão: não é apenas dizer não: é formar o cliente.

Muitas vezes o cliente demanda tal como você relata aí no seu post justamente por não saber consumir serviços de desenvolvimento. E aí entra a segunda parte do nosso papel que normalmente é negligenciada: a formação do cliente.

Se o cliente só demanda, não te escuta: há algo de errado aí não tanto no cliente, mas muito mais em quem presta o serviço que não está sabendo executar esta segunda parte do trabalho.

É o que digo o tempo inteiro no escritório: nossa atividade é muito mais relacionada à relações humanas que meramente programar.

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Concordo 120%. Mas o problema, na minha experiência, é quando a decisão de vender e atender vem de cima e ao peão só resta acatar e aceitar. Creio que seja a atitude da maioria das empresas – tanto quanto formar o cliente, precisamos formar nossos patrões. Nem todos são da área, então eles também pensam da forma que o cliente pensa (o que do ponto de vista do negócio é bom), e muitas vezes não gostam de ouvir os poréns vindos da base do organograma.
Dizer o “não” do ponto de vista da empresa é o mais difícil, pois a empresa não quer prejudicar a relação, não quer perder contratos, não quer perder os clientes grandes, mesmo que estes sejam negociadores agressivos que sempre chegam (desculpe o termo chulo) botando o pau na mesa. E isso cria um desgaste crônico na equipe técnica, que é obrigada a trabalhar sob essas condições e não tem suas argumentações ouvidas.
Isso é comum. Muito comum. Acredito que seja a regra.

sim, é comum demais da conta: e sabe o que é interessante? é que a gente tem sempre de pensar em dois níveis de cliente: o interno (o patrão) e o externo.

curiosamente a luta contra o interno costuma ser mais difícil, mas acredito muito que aí a gente tem de se esforçar ao máximo pra poder ir construindo uma cultura melhor com o tempo. E é natural isto, é muito difícil mesmo. Há toda uma questão de status quo que precisa ser resolvida.

E a pessoa que conheço que melhor fala sobre isto é a Carly Fiorina neste vídeo: Carly Fiorina: The Dynamics of Change and Fear - YouTube

Essencialmente pra que tenha a mudança nós precisamos ser convincentes o suficiente pra que as pessoas aceitem correr riscos. E isto é muito difícil.

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